ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DE LOTEAMENTO FECHADO PODE COBRAR TAXA DE MANUTENÇÃO OU RATEIO DE DESPESAS?
Há muito, juristas e operadores do direito vem discutindo acerca da supremacia da liberdade de associação, prevista no artigo 5º, inciso XX da Constituição Federal, em face das cobranças de taxa de manutenção feitas pelas associações de moradores de loteamentos fechados, e a vedação do enriquecimento ilícito (884, 885 e 886 do Código Civil).
Alguns defendiam que se o proprietário do imóvel não era associado ele não deveria ser obrigado a arcar com as taxas de rateio de despesas. Em contrapartida, outros argumentavam que se o indivíduo adquiriu um imóvel num loteamento sabidamente fechado, em que há o oferecimento de diversos serviços e de ampla infraestrutura de segurança e lazer, não há como se falar na ausência de pagamento de uns em detrimento de outros.
Após reiteradas ações dessa natureza terem chegado ao Supremo Tribunal Federal, este declarou a existência de repercussão geral a respeito da matéria, e recentemente, julgou o Tema 492, que trata da possibilidade da cobrança por parte de associação de moradores, de taxas de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não-associado, restando decidido o seguinte:
É inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei nº 13.465/17, ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir da qual se torna possível a cotização dos proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de acesso controlado, que i) já possuindo lote, adiram ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis ou (ii) sendo novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação esteja registrado no competente Registro de Imóveis.
Diante do entendimento esboçado, entende-se, a título de exemplo, que a cobrança realizada de taxa de rateio pelas Associações de Loteamento Fechado, da cidade de Bragança Paulista, é plenamente legítima.
Isto porque, a Lei Complementar nº 556 de 20 de julho de 2007, instituída pelo Município de Bragança Paulista/SP, que aprova o Código de Urbanismo e dispõe sobre o parcelamento, o uso e a ocupação do solo urbano e dá outras providências, na Seção III – Do Loteamento Fechado) dispõe sobre a instituição e responsabilidades do loteamento fechado:
Art. 65 Loteamento fechado constitui-se por loteamento aprovado como tal, em que há permissão de uso, a título precário, das áreas públicas e das vias de circulação para fechamento total ou parcial das áreas exclusivamente residenciais por meio de cerca ou muro, no todo ou em parte do seu perímetro, devendo assumir a responsabilidade de execução dos seguintes serviços:
I – manutenção e poda das árvores, quando necessário;
II – manutenção, limpeza e conservação das vias públicas de circulação, do calçamento e da sinalização de trânsito;
III – serviços relacionados à segurança interna e manutenção das portarias e sistemas de segurança;
IV – manutenção e conservação da rede de iluminação pública;
V – outros serviços que se fizerem necessários para a manutenção dos bens públicos;
VI – garantia de ação livre e desimpedida das autoridades e entidades públicas que zelam pela segurança e pelo bem-estar da população;
VII – indicações viárias adequadas internas e externas ao loteamento; e
VIII – termo de compromisso de remoção de todos os obstáculos relativos ao loteamento fechado no caso de revogação do decreto de permissão de uso nos termos em que vier a estabelecer.
Parágrafo Único. As áreas públicas e as vias de circulação, que poderão ser objeto de permissão de uso, deverão ser definidas na fase de análise do Visto Prévio do loteamento, podendo ser outorgadas em pedido posterior à aprovação final do mesmo, independentemente de licitação, nos termos do art. 94, § 2º, da Lei Orgânica do Município. (Parágrafo único declarado inconstitucional, conforme ADIN nº 2204161-16.2015.8.26.0000)
Art. 66 A permissão de uso das áreas públicas e das vias de circulação somente será outorgada quando os loteadores ou a totalidade dos proprietários submeterem a administração das mesmas à associação de proprietários, constituída sob a forma de pessoa jurídica, com explícita definição de responsabilidade para aquela finalidade, sendo respeitadas as regras gerais previstas no Código Civil Brasileiro e devidamente constante do Regulamento do Loteamento registrado junto ao Cartório de Registro de Imóveis. (g. nosso)
[…]
É possível concluir que a Lei Municipal de Bragança delega ao loteamento fechado serviços de ordem geral que beneficiam toda a comunidade, e com isso acaba por permitir que haja a cobrança das taxas de manutenção, a qual deve ser prevista em Regulamento Interno dos Loteamentos e devidamente registrado junto ao Cartório de Registro de Imóveis.
Portanto, ante a existência de Lei Municipal e havendo Regimento Interno depositado no CRI, é incontroversa a possibilidade de cobrança de taxa de manutenção por parte da Associação de moradores, segundo o entendimento do Supremo Tribunal Federal.
Ainda é necessário considerar que no recente entendimento ficou estabelecido que na ausência de Lei Municipal e de Regulamento Interno, o marco temporal para a cobrança de taxa associativa é a data de edição da Lei Federal n° 13.465 de 11 de julho de 2017, a qual inseriu o artigo 36-A, Parágrafo Único na Lei nº 6.766/79, com a seguinte redação:
Art. 36-A. As atividades desenvolvidas pelas associações de proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos ou empreendimentos assemelhados, desde que não tenham fins lucrativos, bem como pelas entidades civis organizadas em função da solidariedade de interesses coletivos desse público com o objetivo de administração, conservação, manutenção, disciplina de utilização e convivência, visando à valorização dos imóveis que compõem o empreendimento, tendo em vista a sua natureza jurídica, vinculam-se, por critérios de afinidade, similitude e conexão, à atividade de administração de imóveis. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
Parágrafo único. A administração de imóveis na forma do caput deste artigo sujeita seus titulares à normatização e à disciplina constantes de seus atos constitutivos, cotizando-se na forma desses atos para suportar a consecução dos seus objetivos. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
Partindo destas premissas, é inegável que em ambas as hipóteses há o direito expresso da cobrança de taxa de manutenção, como forma de rateio das despesas geradas de associação.
Sabrina Zamana dos Santos, advogada-sócia do Ferreri Sociedade de Advogados desde 2010, mestre em Direito Constitucional pela PUCSP, especialista em Direito Civil e Processual Civil pela UNIFAAT, e pós-graduanda em Direito Tributário pela PUCMG.